domingo, 24 de julho de 2011

relativizando

Era ainda um ratinho, metida de senhora requintada e altiva, ou imitando os gestos secos do meu pai, tinha sempre muito para dizer. Aqui dentro, saía tudo apressado, simples, sincero, tão verdadeiro que fazia sorrir os adultos. Agora espanto-me por esses sorrisos, agora que sei. Sim, eram sorrisos para as crianças, que não se fazem entre adultos, eram sorrisos enternecidos que não se quer, mas quando se é criança não se sabe, sorrisos deixam-nos a sorrir, para aprendermos a sorrir como eles, para outras crianças, sorrir por perda, sorrir por remorsos, sorrir porque para outras crianças também será passado. E, enquanto andava nas voltas das voltas das saias da minha mãe, era feliz, e os outros, não me lembro como eram, não reparava.
De que serve ser irremediavelmente feliz? Para quê momentos de felicidade? A felicidade é oportunista, deixa-te feliz num mundo de infelizes, vicia-te, torna-te assustadiço, mesquinho, receando perdê-la, essa... que não é tua.
Hoje, disseram-me que relativizo. É essencial relativizar, ser comedido nas emoções. Desde que me lembro, marcaram-me as situações mais caricatas e simples, ridículas e desinteressantes. No entanto, sou esses sonhos e essas infelicidades, respondo por traços do meu passado, e revolto-me. Há pouco de mim construído pelos meus ideais, o pouco que sei, e sei muito pouco, é facilmente ameaçado pelas memórias.
A cidade não me faz querer ser diferente, cheia de desencontros de olhares, mulheres que se entregam sem defesas, visões imaturas da vida, diferentes interesses disfarçados por um momento de prazer..
Descobri que os Homens não cuidam do coração, acham-se no direito de irem meios cheios para corações de copos cheios, e os copos partem-se, e os que se recompõe encontram sempre metade. Quem não sabe guardar o passado, tudo o que der será mal dado, e sendo assim, não deverá ser dado.
Mas amanhã é outro dia, e estas palavras são de hoje, e há esperança de ser feliz. É reconfortante ver que o sol sempre que abre, aquece-me, que as cerejas continuam a ser vendidas ao mesmo preço, até depois da crise, que as pessoas não ficam infelizes ao mesmo tempo. Se souberes aceitar a tristeza e a felicidade, relativizando, não serás dominado pelas emoções.

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